7 HISTÓRIAS DE GELAR O SANGUE - Antônio Schimeneck | Análise Crítica
Desta vez, a crítica será relacionada ao livro 7 Histórias de Gelar o Sangue, escrito pelo autor Antônio Schimeneck, e publicado no ano de 2015 pela editora Besouro Box. Possui algumas belas ilustrações, cujas são realizadas por Marco Sena. O livro é uma antologia de contos de terror e suspense baseados em lendas, em maior parte, gaúchas, apesar de ter duas histórias escritas completamente solo.
A obra abre com "A Simpatia", conto que narra a estranha presença de uma entidade representada por uma pequena garota, após uma suspeita simpatia ser realizada com base em um livro estranho e surrado da escola. A primeira colocação que tenho em relação a este conto, é que a narrativa em primeira pessoa funciona muito bem aqui, e com certeza dá um ar característico do suspense que não seria obtido caso o ponto de vista fosse terceira pessoa - apesar de haver muitos excelentes suspenses que tem o ponto de vista em terceira pessoa. - O enredo começa promissor, mas assim que a aparição de Sara Lemos ocorre, percebo que decai um pouco, porque havia um potencial para fazer algo melhor, mais surpreendente e ameaçador, mas ainda assim, não faz a história ser ruim. Levando em conta que a história deve ser baseada em uma lenda tradicional gaúcha... bem, talvez esta lenda previu o boom de "garotas amaldiçoadas" na mídia nos anos 90 e 2000.
Segunda história, "Olhos na Noite". Também ocorre em primeira pessoa, contando a inusitada aparição de um lobisomem no sítio da vó do protagonista. O estilo de escrita não é peculiar, senão o modo de organizar as falas, que achei um tanto quanto estranho, mas não interfere muito na leitura. Acho muito boa a sacada do enredo não deixar a criatura explícita, apesar dos personagens citarem o antagonista como "o lobisomem". Seria melhor se eles não soubessem o que o bicho era, mas enfim. Adoro a expectativa gerada no primeiro ataque do lobisomem, enquanto o protagonista ainda é criança. No segundo ataque, quando adulto, já temos consciência do que é que está o perseguindo, e isso acaba interferindo um pouco, porém, esta segunda parte da história tem como ponto forte a narrativa mais frenética que reflete muito bem o estado do protagonista. O grande ponto fraco do conto é simplesmente não adicionar muita coisa à lenda do lobisomem, e ser uma trama não tão criativa. Mesmo assim, é uma boa história. Também é baseada em uma lenda local.
"A Burra da Figueira" talvez tenha o melhor desenrolar de história, e é muito interessante o modo que tudo vai crescendo até colapsar no fim... o problema é que este fim é deveras brochante. Seguindo um sonho guiado por um misterioso velho, o menino Orides convida Seu Picucha para o ajudar em uma "caça-ao-ouro". Tem uma crítica muito interessante sobre a tentação financeira e suas consequências. O desenrolar, que destaquei anteriormente, tem diversos de suspense, e a atmosfera densa é muito bem construída. Todo detalhe é essencial para a história, e a imersão narrativa também é excelente. O mistério sobre o velho que aparece nos sonhos do garoto Orides não é revelado nem mesmo no fim da história, ou seja, surge margem para teorias. É possível teorizar que este provavelmente seja algum ancestral do protagonista que guardou sua fortuna para alguém das próximas gerações, no caso, Orides, e Seu Picucha, que cobiçava tal dinheiro para investir em luxúrias pessoais, acabou morto no fim da história. A parada no bar, em que Seu Picucha recebe um anúncio revelando que o dinheiro deveria ser somente da família do menino, e o espírito ainda diz outras coisas que não sabemos. Depois disso, o personagem advertido entra em choque, e pensamos "o que será que lhe foi dito?" até o fim derradeiro da história, em que Orides acorda no dia seguinte e vê seu acompanhante enforcado rua. Este final é a parte brochante. Seria ideal que Picucha ficasse em estado de choque para sempre, o problema é que este elemento já é usado na sexta história - que foi a primeira escrita pelo autor para este trabalho. - Ou, ele quis manter a versão tradicional. Sei lá, só sei que esta poderia ser melhor caso o final não me desgostasse.
"Ilha da Sepultura" é uma das únicas histórias inteiramente escritas pelo autor, e se considerar que "O Último Conto" apresenta elementos de todas histórias anteriores, esta aqui é a única que é de total autoria de Schimeneck no livro. A história segue um garoto adolescente que vai passar uma semana no litoral, perto de uma ilha, onde há um sinistro boato secular sobre a morte de dois jovens por morcegos vampiros, e acaba ficando amigo de uma estranha garota chamada Rebeca. É uma história com uma reviravolta meio óbvia, e a trama é meio genérica também. Não tô no clima de analisar esta, porque foi uma das que menos gostei, mas enfim, o próprio autor disse que esta história é a que ele menos gosta e que considera a pior. Concordo parcialmente com ele - porque ainda há uma história do mesmo naipe mais para frente. - Ainda assim, não é tão ruim, e enquadro ela como "mediana".
"Uma Lágrima na Parede" é inspirada em uma lenda britânica, e não gaúcha - "Olhos na Noite" tem o personagem do lobisomem, que é britânico também, mas aquela história em específico circula como lenda no interior do estado. Já este conto não circula como uma lenda específica -, no caso, a lenda do quadro do "Bebê que Chora", da autoria de um italiano do qual não me lembro o nome. Na Grã-Bretanha, segundo boatos, este quadro estava presente em diversas casas que pegaram fogo anos atrás, então o quadro começou a ser símbolo de mau agouro e maldição. A popularidade de tal boato se espalhou até aqui, onde este tipo de quadro também foi popular, inclusive. Uma garota se muda para uma casa antiga onde encontra algumas velharias em seu quarto - o sótão -, e uma destas antiguidades é um quadro de um bebê chorando, que trás desgraça à casa. O enredo é bem clichezão mas divertido, e dá pra entreter bastante. Apesar de não ser lá aquelas coisas, ainda é razoavelmente bom. O estilo de escrita é bastante parecido com o do primeiro conto. Não tenho muito o que comentar sobre este conto.
"Noite de Caça" é meu conto favorito dentre estes sete, e o que tem o melhor final, de longe. Não há reviravolta, mas há impacto. Enfim. Chico Testa - como é apelidado - é um jovem adulto que adora a caça, e diz não ter medo de nada. Porém, sua coragem é desafiada quando um suposto "tatu" começa a desgraçar o terreno de um sujeito, que pede para alguém caçar o bicho. Esta história foi o estopim para a escrita do resto do livro, e é baseada em um fato real - Chico Testa ainda comparece em uma Igreja, chocado, quase todo dia em uma cidade no Rio Grande do Sul que não me lembro do nome. - De acordo com o autor, foi a primeira história escrita e é sua favorita. Bom, também adoro esta. Tem uma construção inicialmente em um ritmo lento, como "A Burra da Figueira", porém tudo fica mais frenético na segunda tentativa de Chico de caçar o "tatu". A história tem um "final" em aberto, no caso, o que teria acontecido com o protagonista na sua solitária segunda tentativa de caçar o animal. Gera um impacto muito grande ao fim da leitura, e ainda impacta. É simplesmente sinistro.
"O Último Conto" é "pseudo-não-ficção", e é tratada como se fosse na vida real mesmo. Sinopse: o autor, Antônio Schimeneck, vai com alguns amigos a uma pousada estranha e lá veem elementos de todos os contos do livro, que já estava quase pronto - e faltava um último conto. - Bom, esta história é mais uma encheção de linguiça mesmo. Não tenho muito o que comentar. A premissa é boa, mas a execução é bem rasa. Eu a classificaria como "mediana pra ruim", sei lá.
O Ranking:
7. "O Último Conto"
6. "Ilha da Sepultura"
5. "Uma Lágrima na Parede"
4. "A Simpatia"
3. "Olhos na Noite"
2. "A Burra da Figueira"
1. "Noite de Caça"
Conclusão:
É um ótimo livro. Vale a pena ler mesmo. O trabalho de Schimeneck está muito bom, e apesar de diversas histórias não esbanjarem muita criatividade, conseguem trabalhar bem os temas dispostos. O gênero pode ser definido muitas vezes como "suspense". Bom, compensa bastante e com certeza é um dos melhores livros nacionais dos últimos anos.
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